quarta-feira, 15 de agosto de 2007

8

Pressa era realmente a perdição dentro do mar de necessidades que havia invadido o 13º andar de um edifício repleto de ruinas particulares. Mar revolto e intenso. Alto. Muito mais baixo do que alto, mas com dimensões exorbitantes. Levaram suas sargetas particulares, e afogaram-nas. Havia, ainda e muito mais, pobreza. Melhor ou não, agora eram pobrezas, uma pluralidade nem sempre considerada. Entendiam e entediavam-se com a mesma rapidez. Inspiravam-se com o sofrimento alheio, tornando-o meio caminho para a própria perdição, mesmo que isso não fizesse parte de nenhum projeto beneficente para o bem comum. Era inspiração de preenchimento do próprio vazio com mais vazio, eram especialistas!

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

7

Eram propostas e pensamentos completamente aliterados. Tinha-se a impressão de que eram secretos e, ao mesmo tempo, compartilhados. Policiavam e perdiam-se num mesmo embalo. Uma sombra e uma sobra clara de uma imagem escura. Inversão de papéis e dos donos deles. Ninguém era de ninguém, mas queriam ser. Talvez fosse o maior desejo dentre todos os outros. Abriam e esquecia de fechar as aspas a todo instante. Não queriam fazer parte de uma nova família, mas queriam que os outros ali fossem parte da sua. Era uma mistura de querer e não conformar. Desgosto e necessidade. Sabe-se lá o que era e eram. Sabe-se lá o que não queriam. Pausavam-se a todo e qualquer instante, mergulhavam-se na pressa das horas.

segunda-feira, 23 de julho de 2007

6

Um papel que almejava a calmaria de poesia. Mas aquela dona sabia, sabia que tardaria. Pois juntos não eram poesia. Eram traços. Traços desgovernados. Uns mais fortes, coloridos ou simples que os outros. Mas eram absurdamente traços, sem periodicidade e, por vezes, significado. Diziam o que queriam, mesmo que com silêncio. E queriam muito, sempre. Somente se uniam quando o quesito era liberdade, se uniam no querer e não no fazer. Eram mestres da própria situação e da alheia, o que nem sempre causava contentamento mas sempre euforia. Euforia negra, conflituosa.

5

O excesso de poesia que guardavam dentro de seus terrenos interiores continuava intocável dentro dos primeiros versos que compunham juntos, num novo lar. Havia, ainda, atrito sobre a sintonia e sincronia que deveriam seguir. Optaram arriscar primordialmente pela confiança, algo que se abalava imediatamente quando algumas das figuras grotescas tatuadas no corpo do único (e visualmente exagerado) homem da casa. Ou quando as atitudes masculinas da, até então, anfitriã ultrapassavam qualquer limite de cordialidade ao, ironicamente, tentar estabelece-la. Algo parecido com trégua era imposto pelos olhos assustados e reprimidos pela voz confiante daquela que parecia ser a dona dos papéis onde juntavam histórias completamente divergentes.

4

Por hora, soube-se pouco mas houve contentamento. Havia urgência em meio a brevidade. Pareciam todos perdidos e com uma necessidade insistente de perder-se ainda mais do mundo patólogico que os havia engolido. Algumas asas quebradas e penas largadas, precisavam da particularidade de ventos mais ágeis. Talvez um pouco mais de calor. Saiam de jaulas distintas e muito parecidas, ao mesmo tempo, e julgavam-se prontos para dividir suas prisões internas. Ou aprisionar os dividendos.
Não eram tão parecidos quanto [não] esperavam, alguns tinham mais poesia.

3


Teve censurados os pensamentos, felizmente. Agradaria a ambas breves passos pelo recinto, e a um terceiro que ousou presenciar pelo menos metade das poucas palavras que trocaram. Ousadia à parte, havia muito mais encanto do que se pudesse esperar no segundo-outrora_terceiro-estranho. Suspeitou-se agrado, mas não houve dúvida sobre as desavenças - acompanhantes dos provavéis-futuros-inquilinos, que decidiram engajar-se numa disputa juvenil pela preferência que deveriam ter ou não na escolha dos alojamentos. Foi breve. A impressão que se tinha era de pura brevidade. Qualquer que fosse o acontecimento seria breve, agora, que seriam como bons e velhos conhecidos, em prol da boa convivência.
Veio a solução, ímpar. Distintas e tão unidas. A possível-diferença tinha agora abrigo juntamente com o segundo-outrora_terceiro-estranho, juntos da estranha-anfitriã.

2

A diferença por qual esperava não se vestia de nenhum diferencial. Jeans e branco lhe cabiam perfeitamente como se esperassem por breve borrão da tinta preta que fazia as honras da casa, nos olhos. Talvez tivesse guardado o melhor traje nas palavras, esperava ansiosa por cada uma delas. Esqueceu-se de perguntar sobre a identidade, convencida de que estava realmente diante do que esperara por vidas. Perdera toda a concisão por entre os pensamentos, que a impediram de prosseguir em qualquer atitude racional.
Não era a diferença, apenas uma possível inquilina. Apenas uma diferença.Embora tivesse vontade de atirar-lhe nas mãos a vida e exigir encantos no rodapé de cada página contentou-se em antagonizar o próximo capítulo da própria história: apresentou à pálida diferença o cenário aspirante a palco.Talvez estivesse encarregada também de tornar-se vibrante artigo, talvez não.

1

Já havia o céu parido o dia, berrava o sol por entre toda e qualquer fresta oportuna sussurrando silente sinfonia. Aos poucos o dia tomava vida, ia sugando toda a vontade que tinha de ficar na cama até que dele calhasse novamente o fim. Passos, depois carros, passos e carros, depois campainha; não bastasse todos os problemas que enfrentava precisava também lidar com visitas precoces.
Os olhos mal conseguiam guiar-lhe, mas o dito mágico logo encarregou de atentá-la para o que havia do outro lado da porta: uma mulher jovem, comum e envolvida por certa apreensão. Talvez fosse parte de seu passado tentando voltar à tona, talvez fosse alguma encarregada de algum departamento de cobrança, ou talvez fosse apenas alguma vizinha oferecendo uma chícara de açúcar - não suportava a idéia da relação de vizinhança que tivera que estabelecer por ali, portanto alimentava-se da ilusão de que um dia algo diferente aconteceria.